Thursday, December 08, 2005

Amor


É chegado o momento. Vais acreditar... Vou-te convencer da grandeza sobre-humana do meu amor!...
Escuta-me: Não se ama uma velha..uma criatura enferma...uma criatura disforme..O amor que devia ser um sentimento todo da alma, é um sentimento só dos sentidos. Ama-se porque é bom amar...esvairmo-nos na derramação de um liquido peganhento...asqueroso... O amor é uma distracção...como o teatro..como as festas da igreja ..Ama-se uma mulher porque ela é linda...por causa dos seus cabelos, dos seus olhos, da sua boca.. de todo o seu corpo... Pode-se amar uma mulher feia pelos seus vícios estonteantes, perversos...Ah! mas ninguém ama um corpo sem fogo um corpo de carne mole e repugnante; ninguém beija um rosto sem nariz..uns olhos cegos, uns lábios contraídos na crispação de uma ferida mal cicatrizada...Pois bem fosse o teu corpo todo uma chaga e eu amar-te-ia com o mesmo amor!..sim! Marcela, eu amo-te acima de tudo!..Ah! eu gosto dos teus beijos.. da tua carne..gosto de enlaçar as minhas pernas nas tuas ...Mas isso que vale?! O que amo, é a tua alma e essa, seja o feia o corpo, será sempre bela...ama-la-ei sempre...sempre...sempre! Não me acreditas..não crês o meu amor tão forte...vou provar-te que não minto...vou-te dar a maior prova do meu amor tão forte...vou-te provar que não minto ...”


Mário de Sá carneiro, in “Loucura”